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Crônicas do Cotidiano: Onde moram os mais pobres?

Por: Walmir de Albuquerque Barbosa

Professor Emérito da UFAM; Doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo(USP); Graduado em Jornalismo pela UFAM.

Escolas Cívico-militares e Educação Pública

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Não se trata daquela musiquinha que nossas professoras ensaiavam para as festividades do dia do Soldado e que todos certamente lembram: “se não marchar direito, vai preso no quartel”. Dizem os resultados de pesquisa realizada pela PUCRS, assinada por Anderson dos Anjos Pena e outros, que a Escola Cívico-militar, como experiência educacional, representa um “fuzil apontado contra si, cuja obediência poderá significar o seu extermínio”. Deveras, é uma conclusão devastadora, calcada em dados robustos e apoiada em resultados de outras pesquisas feitas sobre a modalidade de ensino, o projeto do Pecim/MEC, Decreto n. 10.004/2019, bem como sobre os resultados de avaliação das escolas implantadas em todo o território nacional, tanto as financiadas pelo projeto MEC quanto as apoiadas pelos Governos Estaduais e Municipais. É preciso que se esclareça, de início, que as Escolas criadas por este projeto nada têm a ver com os tradicionais Colégios Militares, mantidos pelas Forças Armadas Brasileiras para educar os filhos de militares ou os que almejam a carreira militar.

O Brasil brinca, desde muito tempo, com modelos diferenciados de escola pública, tanto para desviar-se da responsabilidade de educar os seus cidadãos quanto para esconder as mazelas resultantes dessa irresponsabilidade. As consequências disso é que ainda temos analfabetos, analfabetos funcionais e, somente agora, universalizamos o Ensino Fundamental. O Ensino Médio está envolvido em brumas com a suspensão de uma nova proposta curricular, que nem chegou a ser implementada totalmente e já se debate com uma série de restrições, de desacertos, apesar de ouvir-se muito que o Estado tem no setor da educação o seu maior “gasto” orçamentário.

O atual governo, ao anunciar que não mais bancará as Escolas Cívico-militares com o orçamento do MEC, deixou aberta a possibilidade do projeto continuar como projeto político da direita conservadora, para implementar diretrizes ideológicas do governo anterior, abraçado por governadores e prefeitos, usando recursos públicos. A nota técnica que subsidiou a decisão do MEC aponta que os fundamentos doutrinários que sustentam o conteúdo, os procedimentos, métodos de ensino e custos financeiros são prejudiciais ao modelo educacional brasileiro instituído pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e destoa das boas práticas pedagógicas que preparam os educandos para a vida. Nessas escolas estão presentes sinais de aporofobia, quando se propõe salvar jovens pobres da delinquência, mas selecionam seus alunos entre aqueles que serão diferentes entre os pobres sob o manto da meritocracia; formas de comportamento restritivas que levam a preconceitos insanáveis; culto ao militarismo como distinção de superioridade sobre civis; entrega da gestão escolar a militares, que passam a exercer influência sobre a educação de crianças e jovens sem que para tais funções tenham sido preparados. Escola Pública boa é aquela que é boa para todos! A decisão tomada, parece, não foi açodada, mas carrega dubiedade ao jogar o problema para mais uma judicialização, como já se começa ver: ações do Ministério Público da Bahia, denunciando ilegalidades e excessos dessas Escolas, que afrontam o Estatuto da Criança e do Adolescente e aos Direitos Humanos, proibindo comportamentos, usos e práticas consideradas incompatíveis com a vida militar a civis como se militares fossem.

Poucas manifestações contrárias, tanto de educadores quanto da parte de não militantes da extrema direita, podem ser por desconhecimento, conveniência, conivência ou medo do embate com os que fazem apologia ao autoritarismo nas escolas, que acusam professores de criminosos e pregadores de “ideologias nefastas”. No entanto, as pesquisas que se debruçaram sobre o tema já apontam que tais escolas e os projetos educacionais encetados por elas atendem a objetivos de ideologias conservadoras e à imposição da disciplina para o tipo ideal de sujeito que atende aos interesses do capital aprendendo a obedecer, a despir-se do senso crítico, a abrir mão do exercício da sua liberdade e dos seus direitos na sociedade civil e democrática. Dar asas a projetos dessa natureza é abrir janelas para o autoritarismo, para o “conservadorismo tacanho” e para o retrocesso da cidadania.


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