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Crise climática

Por: Juscelino Taketomi

Jornalista, há 28 anos servidor da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam)

SEPARATISMO É A PAUTA

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Que tal o Estado do Amazonas livre do Brasil ?

Por Juscelino Taketomi

Assunto polêmico, o separatismo voltou a pauta da imprensa nacional no início de agosto passado, a partir de manifestação ao jornal O Estado de São Paulo do governador mineiro Romeu Zema, que propôs a formação de uma frente política em defesa do “protagonismo” de Estados do Sul e do Sudeste contra o tratamento que o Governo Federal estaria proporcionando a “vaquinhas que produzem pouco”, que seriam os estados do Norte e do Nordeste, em detrimento das “vacas” que produzem muito, que seriam os estados membros do Consórcio Sul-Sudeste (Cossud).

Na ocasião, o governador amazonense Wilson Lima veio a público rechaçar Zema: “Uma declaração dessa é muito ruim porque a pobreza se concentra no Norte e no Nordeste. Sul e Sudeste não querem abrir mão do que eles têm em termos de competitividade, mas é necessário um equilíbrio. É muito perigoso estabelecer um cabo de guerra entre as regiões e colocar uma população contra a outra“.

A declaração de Zema ao Estadão, imediatamente apoiada pelo governador gaúcho Eduardo Leite, se por um lado feita em momento impróprio, por outro acendeu a fúria de grupos separatistas que correram às redes sociais para defender a separação entre as regiões brasileiras dada a histórica incompetência, ou deliberado descaso, do Governo Federal para administrar um país-continente, geograficamente complexo e altamente preconceituoso e provinciano como é o Brasil, o país da Casa Grande e Senzala. Um fato histórico que escancara a incompetência e o descaso é a fundação da primeira universidade federal brasileira (Universidade Nacional do Rio de Janeiro) ocorrida somente em 1920 enquanto os espanhóis fundaram a primeira faculdade na América em Santo Domingo, no ano de 1538.

Em defesa da criação da “Confederação Sul-Sudeste”, a presidente do Movimento O Sul é o Meu País, Nãna Freitas, postou nas redes: “A bandeira deles é uma das nossas há 31 anos”, pregando a separação de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná do resto do Brasil, bandeira de luta do movimento desde 1992. Como os sulistas, também grupos separatistas nordestinos usaram as redes para questionar a República Federativa do Brasil e se posicionarem pela independência de sua região, seguindo os exemplos de movimentos mundiais constituídos na Escócia (Reino Unido), na Califórnia (EUA), no País Basco e na Catalunha, na Espanha.

Portanto, o tema procede e merece ser debatido e aprofundado por nós aqui no Norte, na esperança de que o debate alcance os plenários e as comissões técnicas das Assembleias Legislativas e do próprio Congresso Nacional. Quem sabe não surge, de repente, uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) capaz de alterar a Carta de 1988 que por ora não permite o separatismo.

Segundo o advogado e professor Maurício Gentil Monteiro, titular de Direito Constitucional do curso de Direito da Universidade Tiradentes (Unit Sergipe), “ao estabelecer o princípio federativo de organização política do estado brasileiro, a Constituição assenta a indissolubilidade da união de Estados, Municípios e Distrito Federal, que forma a República Federativa. Uma característica essencial do princípio federativo de organização política é de que ele não garante o direito de secessão, ou seja, os países que adotam a forma federativa de organização política não admitem o direito de separação”.

No entanto, Maurício Gentil reconhece o direito de livre manifestação dos grupos inconformados com o descaso federal com as regiões brasileiras ao longo do tempo, em parte devido à característica continental do país, em parte por conta de comportamentos oligárquicos que travam a modernidade, com prejuízos imensos, principalmente, a um ente federativo do tamanho do Amazonas, um gigante onde um município como Barcelos pode abarcar quatro países com as dimensões territoriais de Portugal.

Cabe a nós, então, o direito de encarar o debate do separatismo e levá-lo em frente – por que não ? – até as últimas consequências, dando plena voz, inclusive, aos que defendem, com unhas e dentes, a República dos Povos da Amazônia. A criação desta República deu o que falar nas redes sociais quando Zema saiu de seus cuidados mineiros para incendiar a mídia com ataques às “vaquinhas” nortistas e nordestinas.

Um pouco de história

Afinal, temos motivos históricos para questionarmos o Poder Central e fomentarmos o debate. Não se pode negar que sempre houve uma luta feroz pela posse da Amazônia, considerada um fabuloso e indescritível manancial de riquezas naturais e por isso mesmo cobiçada pelo mundo inteiro. Nos tempos da Idade Média, tempos da malfadada Santa Inquisição, sabe-se que ingleses, irlandeses, franceses e holandeses chegaram a formar uma frente unida para invadir e se apropriar da região, enfrentando forte resistência de portugueses e mamelucos em sangrentas batalhas terrestres e navais. Os portugueses, com Jesus Cristo na ponta das armas, venceram as batalhas, expulsando os “hereges”.

Unidos pela fé belicosa com que escorraçavam seus inimigos, Portugal e a também católica Espanha resolveram, em 1637, consolidar a conquista da Amazônia com uma tarefa especial confiada ao capitão português Pedro Teixeira. A tarefa, contudo, não foi das mais alvissareiras em razão das divergências que acabariam dividindo portugueses e espanhóis, cada um com o olho maior que o outro em relação às riquezas da região, riquezas que eram bem mais esplendorosas que já haviam detectado os célebres navegadores Francisco Orelhana e Francisco Pizarro um século antes de Teixeira com a ajuda do trabalho realizado por padres jesuítas, conforme narram os pesquisadores Arthur César Reis e Samuel Benchimol em suas obras.

Implacáveis, os portugueses atropelaram o Tratado de Tordesilhas e implantaram o trabalho escravo, matando quem se atrevesse a contestar seus interesses em um cenário de guerra que envolveu os rios Tapajós, Madeira, Negro, Solimões, Branco e Purus. Ergueram fortificações que lhes garantiram a conquista e que até hoje são festejadas e endeusadas no interior do Estado.

Arthur Reis descreve a performance portuguesa como positiva para os interesses do Ocidente com a chegada do Século XVII: “A Amazônia começou a viver a serviço do Ocidente como centro produtor de matérias-primas para o desenvolvimento mercantil e industrial desse mesmo Ocidente no Século XVII. A disputa em torno à soberania a prevalecer foi uma disputa viva, de lances heroicos, que terminaram com a supremacia luso-brasileira. Todo o empossamento no período colonial, do imenso espaço amazônico que os sertanistas, os militares, os religiosos e as autoridades civis realizaram foi, assim, uma resultante dessa luta e dessa preocupação de obter a famosa ‘droga do sertão’ (as drogas eram guaraná, salsa, urucum, cacau, baunilha e castanha-do-pará) para satisfazer as solicitações do Velho Mundo que a ela se habituara e a reclamava sem cessar”.

Cobiça que não cessava

Os tempos mudavam, era verdade, mas a cobiça estrangeira pela Amazônia não cessava, obrigando o governo brasileiro a aventar projetos de desenvolvimento econômico destinados à região. Mas a precipitada abertura do Rio Amazonas à navegação internacional resultaria em erro, culminando em ato de biopirataria dos ingleses que levaram clandestinamente para a Malásia preciosas sementes da Hevea brasiliense, faturando alto em cima da ingenuidade, ou negligência, verde-amarela. Era o início do fim da corrida da borracha. O crime inglês feriu de morte a economia da região.

Surgiu, então, o primeiro plano de desenvolvimento econômico amazônico pelas mãos do presidente Hermes da Fonseca (1910/1914), um plano que, de acordo com Samuel Benchimol, sequer chegou a ser implantado, não merecendo um centavo de caridade no Orçamento da União. Morreu no nascedouro. Depois, com a Revolução de 1930, de Getúlio Vargas, um novo plano foi anunciado para a região. O ponto alto desse plano foi o Discurso do Rio Amazonas, proferido por Vargas em Manaus precisamente em novembro de 1940. Vargas criou os territórios de Guaporé, Rio Branco e Amapá em 1943, em plena II Guerra Mundial, mas não passou disso, seu plano não avançou. No máximo, ele incentivou a produção do látex sob pressão dos países aliados em guerra contra Adolf Hitler. “Foi um período efêmero e de interesse imediatista”, destaca Benchimol, sem deixar de mencionar a dispensa do crédito florestal que manteve por determinado tempo o ciclo da borracha, ciclo que seria sepultado pela absoluta incoerência das políticas oficiais dos governos que sucederam Vargas, sem contar a inércia das lideranças regionais quanto a criação de novas alternativas econômicas fora do extrativismo.

ZFM e a hora de lutar

O modelo ZFM, implantado pelo governo do marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, em 1967, transformou-se, ao longo de décadas, em mais um motivo para a população amazonense abraçar hoje o movimento separatista nacional. Castelo era nordestino e tinha uma visão maior acerca das desigualdades regionais, diferente dos que o sucederam no Palácio do Planalto. Por isso, bancou a ZFM. Para ele, e para nós, o modelo federal de desenvolvimento era a solução correta para impulsionar a economia amazônica, à base de incentivos fiscais, em uma das regiões mais isoladas e esquecidas do planeta.

Mas, sabem os amazonenses que Castelo Branco foi assassinado e, após sua morte, foi iniciada uma absurda campanha para desgastar e desmoralizar o modelo sob a inspiração, sobretudo, de grupos empresariais e políticos do Estado de São Paulo. Com Castelo morto, os governos subsequentes ceifaram a autonomia da Suframa, contingenciaram, no Tesouro Nacional, bilhões de recursos arrecadados pela ZFM e tornaram a concessão do PPB (Processo Produtivo Básico) uma questão pertinente apenas a Brasília quando deveria ser considerada uma prerrogativa da Suframa em Manaus. Nos últimos anos, coube ao governo Jair Bolsonaro o acirramento da guerra fiscal contra o modelo, com o ex-ministro Paulo Guedes fazendo tudo para anular os incentivos fiscais do setor de concentrados de refrigerantes do Parque Industrial Manaus. Ele não tinha o menor escrúpulo de espinafrar o modelo sempre que era provocado em público sobre a ZFM.

Luiz Inácio Lula da Silva é tido como amigo do Amazonas desde a sua primeira ascensão ao Palácio do Planalto em 2003, mas poderia melhorar sua biografia restabelecendo a autonomia da Suframa e corrigindo os crimes de seus antecessores quanto ao contingenciamento e aos PPBs. Ademais, os amazonenses seriam ingênuos em acreditar que, depois de Lula, o próximo presidente da República, seja ele petista ou não, continuará tratando o Amazonas e a ZFM com o respeito constitucional devido. Logo, é justo e oportuno que os amazonenses abracem o debate em torno do separatismo. Quem sabe por meio dele o sonho de um sistema tributário condizente com as peculiaridades da região amazônica vire, finalmente, uma feliz realidade.

Por fim, vale a pena lembrarmos o filósofo francês Jean Paul Sartre, pai do existencialismo, quando disse: “Sede complacentes com vós mesmos e os outros complacentes vos amarão. Dilacerai vosso vizinho e os outros vizinhos rirão. Mas, se bateis em vossa alma, todas as almas gritarão”. É hora, pois, de o debate sobre o separatismo bater fundo na complacência da alma amazônica, antes que seja tarde demais.

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