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Secas e Queimadas

Por: João Melo Farias

João Melo Farias Poeta e indigenista.

Manaus Indígena

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Venho armado com o alvor das vestes do Poeta da Floresta, Thiago de Mello, a quem presto homenagem pela ternura e coragem de decretar no Estatuto do Homem, o branco como a cor determinante da Paz; mas é também o matiz do meu luto, do meu choro e de minha indignação pela extinção dos povos originários:
. Tarumã;
. Crixaná;
. Manaós;
. E Passés,
Que habitavam as cercanias do forte São José da Barra; são nomes existentes hoje apenas nos escaninhos das bibliotecas e futuramente, esquecidos até nos sítios de internet.

A extinção é um preço muito alto, terrível, pago pelos povos originários do Amazonas para ceder o aceiro de suas malocas para o paço do Teatro Amazonas, o espaço hoje onde pisamos e vivemos: a nossa formosa Manaus.

E como falar de vida sustentável se não se consegue conquistar terra para nela plantar e dela viver dentro do território dos extintos: Manaós, Crixanás, Tarumãs e Passés?

Como remeter povos dependentes dos frutos das roças para o bem viver da terra mãe? Índio e terra não dá para separar. Como separar terra da vida de um povo originário?

A felicidade dos povos originários é baseada nas suas mitologias, nas Visões de Mundos de cada um dos povos originários, e, em todas, todos precisam necessariamente da terra para suprir suas necessidades materiais e espirituais. Todos creem na terra como mãe nesta etapa de vida terrena. Essa é a marca do indigenato, o modo de vida dos povos originários.

O modo de vida indígena não é acumulativo do capitalista e nem o ledo social do socialista. É um híbrido de necessidades com a capacidade de retribuição: quanto mais se distribui maior o poder sobre o grupo humano em que se vive e se serve. Isso é o indigenato, o modo de viver dos povos originários.

A colonização cristã ocidental foi imposta pela violência eurocêntrica das espadas; pelo fogo dos arcabuzes; pelo brilho das miçangas escambadas pelo trabalho servil; pela vida eterna prometida pela salvífica Cruz de Cristo, sempre, sempre do lado da Conquista e do Conquistador. E finalmente, pela sedução das filhas dos caciques Manaós, celebrando a politica de casamentos interétnicos formadores da nossa civilização: caboca, morena e ribeirinha. Contudo, trouxe consigo a rendição e a extinção do povo Guerreiro de Ajuricaba!

O pesquisador Eduardo Navarro, professor da Universidade Paulista coletou seis cartas históricas escritas no tupi antigo, em 1.645 pelos indígenas: Pedro Poti e Antonio Paraopeba narrando A Insurreição Pernambucana, sob a visão dos indígenas vencidos nessa guerra.
No Amazonas não se teve a sorte de ter os feitos de Ajuricaba escritos por seus parentes; ou as revoltas do Mawé de Crispim de Leão, que tocou fogo duas vezes na Freguesia de Barreirinha; ou as façanhas de João Cumiaru, Tupinambá que se revoltou e espalhou o medo por onde sua canoa de guerra passava no tempo da Cabanagem.
E por que tanta beligerância por parte desses nobres nativos? Adélia Engrácio pesquisadora da Universidade Federal do Amazonas responde:

  • Eles apenas defendiam suas terras e o seu modo de vida com as armas que dispunham: arcos e flechas.

A Corte portuguesa quando chegou doou terras que não eram suas, eram terras ocupadas tradicionalmente, imemorialmente, pelos povos originários do extenso litoral do Brasil.
A política das Sesmarias chegou até o nosso Amazonas. O Governador Eduardo Ribeiro através do Decreto 37 de dezembro de 1.893 doou uma cidadão, particularmente, uma vasta extensão de terras no médio rio Juruá, que não eram suas. Mais tarde, em 1.988, essas terras foram reconhecidas pelo Governo Federal como terras imemoriais do povo Kulina Madija e se transformaram na terra indígena Kulina do médio Juruá.

Manaus serviu de berço para várias civilizações no tempo, que sucederam aos povos extintos ocupando a territoriedade outrora de povos que, mesmo lutando bravamente por suas vidas, sucumbiram à extinção.

As novas gentes vindas com a migração tomaram conta dos espaços vazios e reproduziram, o quanto puderam, seus modos de vida baseado no uso dos recursos naturais das águas e das florestas, principalmente, às margens dos Tarumãs Açu e Mirim.

Mais recentemente após a criação da Zona Franca com seu Distrito Industrial, em 1.967, a migração dos povos originários se deu de forma urbana. Os indígenas se aglutinaram nas periferias, em casas de palha. Manaus, nesse período, foi batizada como a “Capital das Palhas”, pelo grande número de moradias que se valiam desse recurso natural, barato, abundante e do uso indígena.

As populações que chegavam procuravam preferencialmente o igarapé do Tarumã Açu pela abundância de recursos florestais que essa região detinha até então, e permitia que os povos originários se reproduzissem física e culturalmente.
Após a criação da Zona Franca com seu Distrito Industrial, outra onda de migração ocorreu, desta vez urbana, fixando-se ao redor das invasões de terras onde faltava tudo: água, transporte, energia, trabalho e segurança para as famílias.

Os Filhos de Tupã chegaram em busca das melhorias da vida moderna: saúde e educação para si e seus filhos.
No Alto Rio Negro, a despeito de todas as adversidades, as famílias fizeram dos rios suas estradas de canoas e obrigavam seus filhos a remar longas distâncias até as aldeias que dispunham de escolas. Esse fato fez da Civilização das Águas Negras produzir uma geração de doutores que brilham hoje na cidade e nas cátedras das Universidades Federal e Estadual do Amazonas.

Palestra proferida no evento Junho Verde em homenagem a Semana do Meio Ambiente, promovido pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente do Município de Manaus, no centro de Convenções Vasques Vasques – Manaus, 07.06.2023.


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