Lourenço Braga, do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas
Escrevo estas linhas ao término do que foi chamado por muito
tempo de Semana da Pátria, dias iniciais do mês de setembro que para
nós, neste canto do mundo, congregam duas datas magnas: a de 7, para
relembrar a ousadia do Imperador Pedro de romper os laços de
subordinação política, econômica, jurídica e administrativa com sua
pátria de origem, de onde também vieram, três séculos antes, os que
nos descobriram chefiados por Cabral; a de 5, quando se comemora (ou
deveria comemorar com certa pompa até) a elevação do Amazonas à
categoria de Província, destacando-se do Grão Pará a que se subordinava
na formação do vizinho estado que tem Belém por Capital.
Não escolhi o título por puro diletantismo. É que, dia desses,
recebi mensagem de um amigo, professor que não identificarei também
para “preservar a fonte”, comentando algumas ações governamentais dos
tempos de agora e as denominando de “esquizitisses”, seja lá o que isso
possa significar, mesmo que, com tantas impropriedades no trato do
idioma, talvez consiga aproximar-se de excentricidades, como me pareceu
querer dizer. Então, por mais esquisito que seja e sem pretender tecer
loas ao bizarro, dar-me-ei a registrar alguns fatos que no mínimo fogem
à normalidade do senso comum.
Desculpem-me, então, os que me estiverem lendo.
Estava eu na sala de espera de nosso aeroporto e me pus a tentar
entender o que um zeloso servidor de companhia aérea procurava dizer,
até com insistência, a passageiros que deveriam embarcar em aeronave
de sua bandeira. Lembrei de como às vezes somos tão exigentes com
estagiários que, normalmente com boa vontade, não conseguem realizar
com segurança, presteza e exatidão tarefas de que os incumbimos. O
rapaz que usava o sistema de som de que dispunha não conseguia, por
mais que se esgoelasse, transmitir a mensagem que lhe competia.
Bom, talvez por ter constatado a dificuldade na comunicação,
outro servidor, com voz mais pausada e sem gritos, alcançou afinal que
todos ouvíssemos que os passageiros de determinado voo, com destino a
certo lugar, deveriam procurar o balcão da companhia para despachar
“suas bagagens de mão, sem qualquer ônus adicional”. E a gentil pessoa
a tanto instava os passageiros ao argumento de que o voo se encontrava
cheio. Fui eu, então, até para ocupar o tempo de espera, examinar as
categorias em que são divididos os preços de passagens aéreas e acabei
vendo que pelo custo menor, “tarifa light”, o passageiro tem direito a levar
uma “bolsa ou mochila pequena” e uma “bagagem de mão de 10 quilos”,
e que na categoria seguinte, chamada de “plus” , incorpora-se o direito a
“1 bagagem despachada” de 23 quilos. Deduzi, com pequena lógica, que
se em ambos há direito a porte de bagagem de mão e despacho só na
segunda categoria, parece que que aquilo de mão não é ser despachado.
Ademais, o que tem isso com o alegado motivo de lotação completa da
aeronave? Acaso não são limitados os assentos e a eles não correspondem
os maleiros postos acima? Se assim não é, deveria ser. E não ter “nenhum
custo adicional” não constitui benesse de nenhuma espécie, eis que em
qualquer das 3 categorias a simples aquisição da quase sempre
escorchante passagem aérea gera direito ao transporte de um ser
humano e de uma bagagem de mão.
Esquisito !
Permanecendo no ambiente, confesso minha dificuldade em
imaginar razões que possam levar a verdadeira corrida de passageiros,
às vezes até com atropelos, sempre que os agentes da companhia aérea
anunciam o embarque. Há enorme açodamento e até desordem na
formação de filas, com extraordinária pressa em habilitar-se a entrar no
avião, mesmo que, em alguns casos, até precisem parar no meio do
caminho para término da limpeza do salão do aparelho. Ora, se cada
passageiro tem seu lugar marcado, com poltrona determinada, por que a
agitação, também se sabemos que as portas só serão fechadas quando
terminado o embarque? É o que se repete, mais das vezes, quando o avião
estaciona, concluído o voo, mesmo que todos somente possam sair,
obviamente, depois de aberta a porta da aeronave.
Bizarro, não?
Quando compro uma passagem aérea – nos dias atuais a preços
que assustam até os que dormem – adquiro, obviamente, um lugar
sentado no avião que me deverá transportar, visto como, e disso não há
a mais mínima dúvida, não me será possível viajar em pé. Pois bem, se
não estiver entre os que pagaram mais caro, tenho que comprar um
assento, ou seja, o lugar para sentar.
Exótico, é o que me parece!
Desde 1775, éramos aqui Capitania de São José do Rio Negro, que
se subordinava à Província do Grão Pará, até que, a 5 de setembro de
1850, por ato imperial, fomos destacados do que são hoje os estados do
Pará e do Maranhão e passamos à elevada categoria de Província. E foi
essa alteração de status político-administrativo que depois nos permitiu
a condição atual de Estado do Amazonas. Disto sabemos desde os
ensinamentos primários da professora Sebastiana Braga e das
comemorações que a diretora Janet do Rego Barros Serejo fazia realizar
no Grupo Escolar Antônio Bittencourt, com hasteamento da bandeira,
sessões literárias que incluíam declamação de versos onde José e depois
Justina brilharam, junto com outros, cântico do hino da própria escola,
homenageando o patrono ex-governador e professor, “patriota ingente” e
encerramento com o hasteamento da bandeira e com o hino nacional tão
cuidadosamente ensaiado por dias muitos. Era como festejávamos o
aniversário do Amazonas, no dia 5, que era feriado e que inaugurava a
semana da pátria.
Também foi o que vi no Colégio Estadual, onde cursei as duas
séries iniciais do ginásio, e depois no Instituto de Educação, até o final
do curso de formação de professores, incluindo os desfiles cívicos para os
quais nos preparávamos com ensaios que se iniciavam tão logo
terminadas as férias de junho. E lembro que havia disputa para fazer
parte da banda de música – que bem depois ganhou o nome de fanfarra
– não só porque devêssemos exibir garbo e beleza na avenida Eduardo
Ribeiro mas, também, pela competição desde sempre estabelecida com a
Escoa Técnica, o Colégio Dom Bosco, o Estadual e o Pedro Silvestre. E
isto permaneceu por muito tempo, na avenida Djalma Batista e depois no
chamado Sambódromo, ensinando e incorporando noções de patriotismo
e de respeito às tradições.
E tudo fazia com que aulas fossem suspensas na semana, em
homenagem ao aniversário a 5, do Amazonas, com a elevação “concedida”
pelo Imperador daqui, e a 7, do Brasil, comemorando a Independência
gritada por Pedro às margens do Ipiranga. Nos dois dias, servidores
públicos eram dispensados do trabalho, salvo os de serviços essenciais
como saúde e segurança, o que também servia para permitir a muitos
assistir e participar dos festejos públicos de um e de outro dia. Foi, por
exemplo, o que pude aplaudir como Secretário de Educação, ainda no
recente 2018.
Este ano não foi assim. Como se fosse possível até diante do que
dispõe a lei federal 9093, de 2005 – que considera feriado civil, no
território respectivo, a data magna de cada Estado fixada em lei estadual
– postergou-se para o dia 8 a possibilidade de comemoração, com simples
transferência da suspensão de funcionamento dos órgãos públicos, salvo
os essenciais.
Pedro, o II, há de ter lamentado que 173 anos depois não se tenha
comemorado a Lei nª 582, de 5 de setembro de 1850, que elevou “a
Comarca do Alto Amazonas, na Província do Grão Pará, a cathegoria de
Provincia, com a denominação de Provincia do Amazonas” (na redação
original).
Lamentável esquisitice baré!