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Tempos de incivilidade

Por: Luiz Thadeu Nunes de Silva

Engenheiro agrônomo e viajante do mundo

“Cuidado com os amanhãs……”

beautiful sun rise and cloudy sky

Existe um senhor chamado Tempo, que nos ensina tudo sobre as voltas que a vida dá. Sobre o momento de cada coisa e o lugar de cada um. Sobre as dores que não menciono, as cicatrizes que me tatuam a carne e chicoteiam a alma; as alegrias que chegam ao final de cada ciclo. A vida é isso, ciclos. Contínuos, às vezes inacabados.


Ah, Tempo, tempo… poeta tão bonito, compositor do meu destino! Não persigo teus versos, tu me encantas com tuas lições. Quantas lições. Alguns sinais me foram dados, eu, absorto, não prestei atenção. Miopia do Amor, ousadia da ignorância, de quem ignorou seus avisos, suas mensagens.
E chega uma hora, -que talvez seja tarde demais pra desistir…tarde pra continuar a insistir; porém o mais viável, será sempre apenas resistir…Resistir por quê? Resistir pra quê?


“É bom ter cuidado com os ‘amanhãs’, alguns têm o estranho hábito
de ser tarde demais”….li anos atrás em uma parede desbotada, escrito a carvão, em uma fazenda no interior da Bahia. Não sei quem escreveu. Quantas manhãs essa pessoa adiou, pensei hoje contemplando o mar, enquanto o sol se recolhia, dando lugar à noite.
Ah, tempo, segues teu curso, impávido, a gargalhar de mim. Ele dirá: “quem pensas que és? Não és nada. Pensas que aprendestes alguma coisa? Que nada”.


“O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria. Aperta daí afrouxa. Sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”, João Guimarães Rosa em “Grande Sertão: veredas”.
Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha, porque cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra. Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha, e não nos deixa só, porque deixa um pouco de si e leva um bocadinho de nós. Essa é a prova de que as pessoas não se encontram por acaso. “As pessoas podem até entrar em nossas vidas por acaso, mas não é por acaso que elas ficam”, ensinam os poetas.


Dia desses, ao caminhar pelo centro histórico da cidade, ao cair da chuva, me refugiei na marquise de um sobrado. Vi passar um jovem casal: conversando, rindo, agarradinhos, dividindo o mesmo guarda-chuva. Lembrei de ti, lembrei de mim, senti saudade de nós: jovens, felizes, dividindo tudo o que tínhamos, muitos sonhos de futuro. Senti inveja dos transeuntes. Senti falta de nossa juventude. Senti falta de nossos sorrisos. Senti falta de nossos sonhos. Senti falta da vida que compartilhamos. Como fomos felizes. Tudo tão simples.


Ah, tempo, acasos da vida que se perderam no tempo. Sonhos de ontem que não tive tempo de viver e que agora deixaram de ter minhas medidas.
Lembro de Charles Baudelaire, em Poema em prosa:
“Deveis andar constantemente embriagados. Tudo consiste nisso: eis a única questão. Para não sentires o fardo horrível do tempo, que vos quebra as espáduas, vergando-vos para o chão, é preciso que vos embriagueis sem descanso.


Mas, com quê? Com vinho, poesia, virtude. Como quiseres. Mas, embriagai-vos.
E se, alguma vez, nos degraus de um palácio, na verde relva de uma vala, na solidão morna de vosso quarto, despertardes com a embriaguez diminuída ou desaparecida, perguntai ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntais que horas são. E o vento, a vaga, a estrela, o pássaro, o relógio vos responderão: — É a hora de vos embriagardes! Para não serdes escravos martirizados do tempo, embriagai-vos! Embriagai-vos sem cessar! Com vinho, poesia, virtude! Como quiseres!”.
Preciso me embriagar. Urgentemente.


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